quinta-feira, 16 de outubro de 2014

VOU EMBORA PRA XAMBÁ ( CRÔNICA)




VOU EMBORA PRA XAMBÁ
Ysolda Cabral


O dia está lindo, mesmo tendo amanhecido um tantinho nublado. Saí para trabalhar por volta das seis e vinte da manhã. Peguei o opcional e cochilei, em meio a perfumes e silêncio, até alcançarmos a Agamenon Magalhães, à altura do Hospital Real Português, quando, ainda sonolenta, fui à procura de outra condução para completar o trajeto casa/trabalho.

Na parada, tudo me pareceu alegre e divertido. Acordei! De um lado da avenida, uma calçada tomada por vendedores de fones de ouvido, capinhas de celulares e sobrinhas para todos os gostos e idade. Do outro, vendedores de tapiocas, bolos, frutas de várias espécies, que me atraíram por demais... Senti fome, mas me segurei desviando o olhar para os pés de acácias, ainda sem elas, e para os passarinhos saltitantes e cantores que, infelizmente, ninguém escutar mais podia, por conta dos sons da manhã de uma grande e bela capital.

Como a cidade do Recife é linda e cheia de vida! De repente me deu uma vontade enorme de sair a passear por lugares que ainda não conheço, apesar de morar aqui há longo tempo. Chamei-me a atenção para as responsabilidades de agora e esquecer, de vez, possibilidades admitidas apenas na juventude, quando, no máximo, me permitia gazear aula para assistir o namorado jogar vôlei na quadra do Comércio Futebol Clube de Caruaru, minha terra natal, correndo o risco, inclusive, de ficar de castigo, caso alguém fosse contar o feito ao meu pai.

Mas o fato é que o dia me tentava e foi difícil me conter. Sorri e me concentrei nos ônibus que poderiam me atender no tanto que faltava para chegar ao meu destino, quando me dei admirando um lindo coletivo de cor verde - o verde da esperança -, onde se lia: XAMBÁ!

- Que nome lindo! Fantástico! - falei, fascinada, para mim mesma.

Fiquei verdadeiramente encantada e com vontade de saber que lugar era aquele que fazia todo mundo querer ir para lá. E gente de todas as idades e classes sociais! Mais que depressa disputei um lugar na fila e entrei. Eu queria ir pra Xambá de qualquer jeito ou, pelo menos, desfrutar daquele itinerário desconhecido, alegre e convidativo, nem que fosse só por um pouquinho.

Tive que gritar para o motorista escutar o meu bom dia e me responder se o ônibus iria percorrer toda a avenida Agamenon. Apressado, ele respondeu que sim e eu sorri contente da vida!

Um moço bonito, que acompanhava o motorista na batucada da cantoria que cantavam, fazendo coro com o pagode da rádio FM, cedeu-me o lugar, gentilmente. E depois que o ônibus estava devidamente super, hiper lotado - afinal, todos queriam ir pra Xambá -, seguimos viagem.

O pagode me animou mais um pouquinho e, de repente, me vi fazendo parte da percussão com as fivelas de minha bolsa. Como ir para Xambá era animado!

Pena que chegou a minha parada e tive que deixar o coletivo seguir viagem sem a minha pessoa...Que tristeza me deu!

Jurando um dia seguir em frente, cheguei ao meu destino e fui logo perguntando para o segurança se sabia onde ficava Xambá:

- Xambá é o nome de um terminal Integrado, e fica em Olinda, minha senhora! - respondeu-me, meio abusado.

Não sei se fiquei triste com o abuso dele, se pelo "minha senhora", ou se por Xambá não ser um lugar exatamente tipo cidade, bairro, vila, reino, paraíso, estância encantada...

Contudo, depois de muita reflexão, chego à conclusão que Xambá é tudo isso, desde que pode nos levar a muitos lugares e possibilidades...

Minha alegria voltou!

Um dia vou embora pra Xambá - mesmo que lá não tenha rei e nenhum amigo meu. De lá, só Deus sabe que rumo vou tomar...

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E, com a licença do Manoel Bandeira,
e dos Los Borrachos Enamorados...




VOU EMBORA PRA XAMBÁ
VOU SIM, QUERO SIM
Ysolda Cabral


Vou embora pra Xambá!
Lá não tem rei; e eu nenhum amigo.
Mas terei mesa, cama e banho,
Muito aconchego e abrigo.

Vou embora pra Xambá!
Eu vou sim, quero sim , posso sim,
e ninguém vai mandar em mim.
Eu vou sim, quero sim!

Vou embora pra Xambá!
Aqui não sou nada não.
Sou uma pobre infeliz,
sofrendo do coração...

Vou embora pra Xambá!
Lá vou ter tudo o que eu quis.
Menos academia de ginástica,
que me faz cansada, dolorida e infeliz...

Mas vou andar de bicicleta!
Nada de burro brabo
e nem de pau-de sebo...
Eu quero andar é de barco,
e ter muito aconchego.

Vou embora pra Xambá!
Vou tomar banho de mar
e, quando me cansar,
descansarei no casario.

E quando o vento for frio,
com um cobertor de orelha
dormirei a noite inteira,
até que o frio me esqueça.

Vou embora pra Xambá!
Lá não tem telefonia.
A comunicação é feita por telepatia,
sinalizando sentimentos.
E tudo é só amor, bom humor e alegria!

Vou embora pra Xambá!
E quando estiver triste e sozinha,
vou me lembrar desta cidade
que nunca me quis de verdade,
mandando àquele lugar
a mãe e até a vovozinha...

Vou embora pra Xambá!.

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Praia de Candeias - PE
Em conjecturas...
Será que Xambá só tem chambaril?
08.10.2014 - 4a. Feira


Para ouvir a música, acesse:


Publicada no Recanto das Letras 
Em 08/10/2014
Código do texto: T4992030 
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