sábado, 12 de março de 2016

REGISTRO DE UM TRAJETO - CRÔNICA




REGISTRO DE UM TRAJETO
Ysolda Cabral



Finalmente o relógio marca quatorze horas! Registro o ponto e saio do trabalho excessivamente cansada. Nada me ocorre para uma sexta-feira à tarde a não ser a vontade de chegar logo em casa para me livrar dos saltos, das roupas suadas e me colocar debaixo de uma ducha fria, por tempo indeterminado. A semana foi difícil e o calor está insuportável.

Dirijo-me à parada de ônibus. O meu carro está outra vez na oficina e o taxi hoje está fora de cogitação. Fico ali sem pensar em nada, apenas olhando o calor de mais de 30 graus subindo do asfalto, como se viesse do próprio inferno a tirar o ar que respiro e entorpecendo a minha mente, enquanto meus pés reclamam o peso excessivo que sustentam.

Finalmente o ônibus chega e dou graças por encontrar um assento desocupado à direita do motorista, - lado sem Sol - e dou graças, principalmente, por conseguir chegar até ele sem levar um tremendo tombo - o motorista guia usando o volante e os pedais para descontar sua raiva nos passageiros. - Sabe-se lá qual a razão! Isso é tão comum por aqui!

Enfim, estou sentada e quando começo a me sentir um pouco melhor, percebo que o passageiro ao meu lado fede que nem gambá. – O final de semana começa bem!...

- Calma, Ysolda! Prende a respiração e aguenta firme! Recomenda-me os meus pés calçados, cansados, suados, mas sem chulé! Olho para o lado, de soslaio, e me deparo com um rapaz até bonito, de uns 30 anos, no máximo, vestindo um jeans moderno - todo rasgado – a ler um livro com cara de intelectual, porém sua leitura é supersônica. Ele termina a página da esquerda do livro e ao invés de ir para a da direita, ele vira a página para a seguinte de pelo menos três ou quatro à frente e é assim que vai lendo por todo o trajeto. - Fico impressionada e me pergunto se ele leu o "Apenas Poesia" daquele jeito e sorrio do pensamento inusitado. - Quem leu aquilo? Só eu que o escreveu sem saber a razão de ter escrito e alguns poucos familiares...

Concentro-me na tarefa de respirar apenas quando o ônibus diminui a velocidade ou para, pois do contrário o Vento faz questão de ventilar todo o mau cheiro do “intelectual” pra cima de mim. - Até parece vingança, propósito! Não fiz nada com o Vento! Muito pelo contrário. - Que coisa!

Finalmente, chega minha parada e desço aliviada por poder respirar normalmente e sem sentir cheiro ruim.

Ah, pois não é que estão queimando lixo nas redondezas!...

Socorro! Preciso ir embora daqui!

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Praia de Candeias-PE
Diário de sexta-feira
11.03.2016

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